Estava eu em casa naqueles dias nublados com uma chuva que teimava em cair. Sabe aqueles dias que não tem nada para fazer?! Esse era um dia desses...
O dia tinha cara de preguiça e cheiro de chuva, não se via o Sol, o dia estava escuro, aquele friozinho gostoso, perfeito para dormir. Mas... cadê o sono?
Comecei a ficar inquieta, andava para lá e para cá, até que vi pela sacada do apartamento o meu vizinho da casa a direita cortando o pé de maçã que ficava no fundo do quintal. Na hora parei com aquela minha inquietude e comecei a me perguntar porque ele estava cortando o pé de maçã. Lembrei-me de como na minha infância eu gostava daquele pé, eu o achava lindo, ficava contando as horas para ir na casa do Dr. Sérgio (esse era o nome do meu vizinho) pedir uma maçã. Quantas vezes eu e o seu filho brincamos na sombra daquele pé e quando não era época de dar maçã eu ficava ansiosa e perguntava todo dia para minha mãe que dia o pé ia começar a dar minhas tão queridas e gostosas maçãs.
Quando chegava a época da maçã ia aquele tanto de criança para a casa do Dr. Sérgio para panhar as maçãs. Ele adorava porque alegrava sua casa, que tinha um aspecto tão solitário e sombrio. Fiquei sabendo, quando criança, que sua mulher morreu no parto do seu único filho e depois disso dizem que o Dr. Sérgio nunca mais foi o mesmo. Eu sei que a alegria do Dr. Sérgio e do seu filho era quando o pé de maçã começava a dar frutos e a criançada se reunia lá!
Aquele pé deu muita alegria a criançada da vizinhança e ao Dr. Sérgio e mesmo depois que nós crescemos as outras crinças gostavam de ir lá. E por que ele agora resolveu cortar o nosso pé de maçã?
Foi nesse instante que me lembrei que há uns cincos anos atrás o pé de maçã tinha parado de dar nosso tão abençoado fruto. Como o Dr. Sérgio e as crianças do bairro ficaram tristes. Começou a rolar um boato que a macieira tinha cansado daquele tanto de criança subindo nela, jogando pedra para pegar seus frutos e resolveu parar de dar maçãs porque assim resolveria seu problema.
No início eu não acreditei naquela versão, mas depois de dois anos sem dar frutos eu comecei a acreditar que a macieira tinha realmente se cansado da criançada. Hoje olhando daqui de cima percebo que a casa do Dr. Sérgio voltou a ter aquele ar sombrio e triste, a alegria daquela casa foi-se embora com os frutos do pé de maçã.
Mas, mesmo assim continuei sem entender porque que o Dr. Sérgio estava cortando o pé de maçã. Mesmo sem dar frutos aquele pé era tão bonito.
Minha curiosidade foi tão grande que resolvi fazer uma visita e aproveitar para perguntar. Afinal, tinha muito tempo que eu não ia conversar com o Dr. Sérgio e eu sabia o carinho que ele tinha por mim. Quando cheguei lá Dr. Sérgio fez uma festa, ficou super contente. Conversa vai, conversa vem, perguntei sobre o pé de maçã. Na mesma hora, com aquela voz mansa, ele me perguntou: "macieira serve para quê?" Eu respondi a resposta mais lógica: para dar maçã. Ele concordou e ainda completou: "ela serve para matar a fome e a nossa não quis mais fazer isso. Ela só tem folhas, o nosso pé de maçã deixou de cumprir seu propósito que é dar frutos e por isso ele agora nunca mais terá essa dádiva, porque eu o cortei".
Nessa hora ficamos em silêncio e eu me lembrei de quando ele falou "nossa macieira", como eu gostava quando ele se referia à macieira como sendo nossa... Dei-me conta que estávamos muito tempo em silêncio, então puxei outro assunto qualquer e depois me despedi. Eu tinha o Dr. Sérgio como um segundo pai, afinal cresci no seu quintal.
Cheguei em casa feliz por ter visto e conversado com o Dr. Sérgio. Sentada na sala olhei de rabo de olho para seu quintal e senti falta do nosso pé de maçã, mas entendi o porquê da atitude do Dr. Sérgio. Afinal, cada coisa tem sua função e precisa desempenhá-la. Foi nessa hora que me veio a seguinte questão: Será que eu estava desempenhando bem a minha função?!
E você será que você sabe qual sua função e se você a está desempenhando bem?!
Por
Amanda S. Menezes
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